Gustav Klimt - Palácio sobre a água (1908)
- Será que Sua Senhoria tem
alguma intenção religiosa? – inquiriu Diotima.
- De momento, descobriu apenas
que na história da humanidade não há retrocessos voluntários. O que dificulta
as coisas é não termos também nenhum progresso aproveitável. Convenhamos que é
estranha esta situação em que não podemos avançar nem recuar, e ao mesmo tempo
vamos dizendo que o presente é insustentável. (Robert Musil, O Homem Sem Qualidades, vol. I, p. 370)
A história da humanidade – que não é outra coisa senão o trabalho do
negativo, para relembrar Hegel – parece ser um sítio infrequentável. Não por
uma questão de pudor moral, mas por aquilo que Robert Musil coloca na boca de
Ulrich. Para o passado não há regresso voluntário. O futuro também não é o
lugar onde nos conduza um progresso aproveitável e o presente, bem o presente
é, como sempre, insustentável. Poder-se-ia fazer deste excerto de O Homem Sem Qualidade uma quantidade de
leituras políticas. Limito-me a constatar, contudo, que o ardor romântico com a
História pode ser uma doença ou coisa ainda pior. Nós já não nos lembramos, mas
houve um tempo em que os homens não se viam como ser históricos. Olhavam para o
tempo não como uma linearidade que avança ininterruptamente do passado para o
futuro, mas como um ciclo de eterno retorno, uma imagem plasmada da ciclicidade
das estações do ano. Nós já não podemos retroceder a esse tempo, pois a
História apossou-se de nós e obriga-nos a viver nela. Obriga-nos a viver nesse
sítio infrequentável, no qual, a cada momento, nos sentimos vítimas de um
decreto que nos expulsa da própria casa. A História, essa terrível invenção
romântica, é o lugar onde o homem perdeu o lar, onde foi expulso da sua própria
casa.
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