Luigi Russolo - Dinamismo en un automóvil (1911)
O projecto da Modernidade
funda-se, por conseguinte, — o que ainda nunca foi claramente enunciado — numa
utopia cinética: todo o movimento do mundo deve passar a ser realização do
plano que nós temos dele. (…) Seria demasiado pouco dizermos que a Modernidade
prometeu ser ela própria, doravante, a fazer a história humana. No seu núcleo
ardente, ela não quer apenas fazer história, mas também Natureza. Enquanto este
século duro se aproxima do seu fim, vai-se espalhando a noção de que a
história a fazer era um pretexto. O tema decisivo dos tempos modernos é a
Natureza que há a fazer. [Peter Sloterdijk, A Mobilização Infinita. Para
uma Crítica da Cinética Política]
1. É dentro desta utopia cinética que deveremos compreender a retórica política dominante no mundo ocidental. Constantemente somos confrontados com um movimento que pretende mobilizar-nos para uma contínua reconstrução das instituições, funções, atitudes e até dos próprios gestos. Veja-se o que se passa nas instituições públicas e nas empresas privadas. A necessidade de inovação não é mais do que a narrativa legitimadora da mobilização infinita do homem até à reconstrução da sua natureza, ao homem novo, até que se possa dizer: Ecce Homo!
2. Observe-se, também aqui, como marxismo e liberalismo, socialismo e
capitalismo se apresentam como as duas faces da mesma moeda. No marxismo, é a
necessidade que empurra a mobilização militante até ao paroxismo; no
liberalismo, é a liberdade que se realiza como movimento contínuo de diluição
no futuro.
3. No antigo mundo marxiano, o movimento, ao fundar-se na necessidade,
tornou-se mais rígido e duro. A mobilização militante conduziu directamente à
sobreposição da dimensão militar.
4. No mundo liberal, o movimento, ao fundar-se na liberdade, torna-se
mais plástico e mais maleável, mas também mais dissolvente das instituições e
modos de vida. Para não perecer imediatamente, necessita do contínuo apelo à
inovação. A produção do novo está para o mundo liberal como a mobilização
militar estava para as sociedades marxistas: o véu que cobre o puro vazio. (averomundo, 2007/04/13)
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