A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.
O chefe do CDS-PP é uma lição viva daquilo que
constitui a verdadeira natureza da política. Ele não é estruturalmente
diferente dos outros políticos, mas é muito mais inteligente e eficaz na
prossecução dos seus objectivos. O Dr. Portas consegue a coisa
extraordinária de estar comprometido com a política deste governo até à
ponta dos cabelos, e passar para a opinião pública a ideia de que é uma
espécie de oposição no interior do governo às maldades deste. Ele faz
parte do grupo de pessoas que toma as decisões que estão a destruir
Portugal, mas dá o ar que não é responsável por tamanhas malfeitorias.
O 25 de Abril intensificou nos portugueses uma terrível ilusão que já
vinha do salazarismo. Pensam que o fundamental da acção de um político é
servir o país e os cidadãos. Esta é a pior das ilusões. Um político só
ambiciona uma coisa, o poder. Toda a sua acção visa conquistar e manter o
poder, custe o que custar. Salazar sabia-o muito bem, assim como os
políticos da democracia, de Soares a Cavaco, de Cunhal a Sá Carneiro, de
Durão Barroso a Sócrates e por aí fora. Se por acaso fazem obra que
sirva as pessoas, isso deve-se apenas à necessidade de manter o poder e
não por amor às pessoas. Na política não há amor ao próximo, nem devoção
ao bem público, nem serviço à comunidade. Há o poder. Todo o resto é
acessório e instrumental.
O comportamento aparentemente bipolar de Paulo Portas é, deste
modo, explicado facilmente. O que está em causa, na sua acção de
distanciamento do governo relativamente ao agravamento das contribuições
sobre os reformados, não é o amor por estes ou preocupação com o seu
sofrimento, mas pura e simplesmente o poder. Os reformados constituem um
nicho do mercado eleitoral muito grande, talvez o maior grupo social do
universo eleitoral. É desse grupo que Paulo Portas espera o apoio para
que, no futuro, se possa manter no poder, coligado com o PSD ou com o
PS.
Tenho visto muita indignação mal disfarçada por parte dos
apoiantes de Passos Coelho. Queixam-se da desonestidade de Portas, da
sua deslealdade, do oportunismo do chefe dos centristas. Esqueceram já a
campanha absolutamente mentirosa levada a cabo por Passos Coelho para
chegar ao poder, esqueceram a desonestidade e o oportunismo das sua
promessas eleitorais. Mas a única coisa de que se devem queixar é da
natureza. Esta foi benévola com o Dr. Portas, pois deu-lhe uma
inteligência que falta, e muito, noutros lados. Quanto ao resto, nada de
novo sob o sol. É apenas a luta pelo poder e Paulo Portas não se
esquece do que é essencial.
Disse o insuspeito professor Marcelo, que a Direita portuguesa é a mais estúpida da Europa.
ResponderEliminarNão tenho dúvidas da razão que lhe assiste, mas no que respeita a Paulo Portas, a qualificação não se aplica. Ele é Inteligente e sobretudo esperto.
Abraço
O problema de Portas é que utiliza a inteligência que generosamente lhe foi dada para ser esperto. Um desperdício de talento.
EliminarAbraço
Muito bom... e tb os comentários. De facto, "um desperdício de talento". :)
ResponderEliminarO talento é uma coisa difícil de gerir na política portuguesa. Uns não o têm, outros deseperdiçam-no. A coisa só podia dar no que está a dar.
EliminarNos tempos em que vivemos, e a meu ver, o conceito de político tem vindo a alterar-se a nível internacional. Este desenvolvimento, que se deve essencialmente à crise, trouxe algumas boas notícias, ainda que poucas, para a classe política. Dirigindo-me diretamente ao assunto, considero que atualmente existem alguns políticos que não ambicionam apenas o poder. Pode-se observar, até pela constituição do próprio governo português, que já existe uma certa preocupação (ainda que escassa) em "despolitizar", de forma a recrutar as elites tecnicamente mais qualificadas. Sendo a atual situação económica e financeira do país deplorável, interrogo-me se será o poder por si só, força suficientemente grande para mover o político a enfrentar tamanhas adversidades e desafios.
ResponderEliminarNão me parece que se estejam a recrutar as "elites tecnicamente mais qualificadas". Estão a ser recrutadas pessoas - como o foram em governos anteriores - que não fazendo carreira nos partidos políticos ambicionam a experiência do poder. Não há nenhuma despolitização, há outra forma de conceber a experiência política. Quanto às adversidades e aos desafios, estes são muito relativos do ponto de vista pessoal. A acção política é inimputável. Mesmo que se tomem más decisões, não há qualquer risco. A política é uma actividade relativamente protegida, ao contrário de outras.
EliminarPor outro lado, quando afirmo que o que está em questão na acção política é o poder e apenas o poder, não há nisso uma avaliação mas uma constatação de facto. Os políticos lutam pelo poder e agem em conformidade com a possibilidade de o alcançar e de o manter. O resto é acessório, por mais causas que eles aparentem defender.
Cumprimentos.