domingo, 12 de maio de 2013

A nossa tragédia

Jaime Colson - Modelo de catarsis (1932)

Há uma diferença essencial entre as tragédias clássicas gregas e a situação trágica em que vivemos. As primeiras, segundo Aristóteles, tinham como função purificar, nos espectadores, os sentimentos de terror e de piedade, um contributo para a vida cívica. No caso português, ou europeu, a tragédia não é qualquer coisa que o espectador observe sentado num anfiteatro, onde assiste à inevitável e pré-anunciada perda do herói trágico. O espectador ocupa agora o centro da acção trágica e vê-se a si-mesmo a perder-se nos meandros escabrosos que a hybris de politicos, banqueiros e economistas lançaram o país. Nesta tragédia, não há espectadores que possam purificar os sentimentos de terror e piedade. O que temos é uma multidão que se dirige para um destino fatal, uma multidão cada vez mais aterrorizada que, em murmúrios ou em altos brados, não tardará a clamar por piedade.

6 comentários:

  1. Nem mais! A tragédia é que não nos limitamos a assistir, participamos no nosso próprio sofrimento.

    Um abraço

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    1. Não só participamos, como, por vezes, acabamos por ser cúmplices.

      Abraço

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  2. Espetadores e não atores... Esse é o drama.

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    1. Talvez a realidade seja pior. Somos, por vezes, actores que agem contra si-mesmos. Por exemplo, o que levou tanta gente da classe média que está a ser atingida por este governo a votar nesse mesmo governo?

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  3. Boa pergunta, incrível, não é? Aliás, vou mais longe - o que faz as pessoas não votarem e deixarem outros escolher por si? Também condeno a abstenção, porque não é a solução. O comodismo não é nunca a solução.

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    1. Não votar é uma espécie de decisão pela não decisão (Sartre chama-lhe má-fé), mas nem sempre é comodismo. Muitas vezes é uma radical descrença, mesmo que pouco consciente, no valor do voto enquanto instrumento político. A abstenção tem um valor político que indica o limite do regime democrático.

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