A pátria, in illo
tempore, tinha uma alma oculta, uma alma que não podia manifestar-se na rádio
e na televisão portuguesas, mas manifestava-se, por exemplo, na televisão
francesa. Era uma alma recalcada. A voz de Luís Cília - não é uma voz extraordinária,
mas é uma voz de que gosto bastante pelo seu timbre nostálgico e, diria, quase sebastianista - era uma das vozes dessa alma abscôndita, que atravessava o país
pelo silêncio da noite. Aqui canta uma canção contra a guerra colonial. O tema,
a deserção, ainda gera incómodo – a palavra traidor aflora então com facilidade
– em alguns sectores mais nostálgicos do antigo regime ou menos conformados com
os que, perante a guerra, decidiram refugiar-se no estrangeiro. A generalidade do país não tem,
todavia, qualquer ressentimento perante os que desertaram. O original em disco
é de 1964 e a gravação que se apresenta é de 1973. Pelo que se percebe da
imagem da capa, no canto superior direito, o disco foi editado pela célebre
Le Chant du Monde,
uma editora discográfica francesa claramente engagée.
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