domingo, 4 de outubro de 2020

A destruição da família

Paul Gauguin, La familia Schuffenecker, 1889

Uma moda nascida entre os sectores mais conservadores e autoritários da direita, e que se está a propagar para sectores mais democráticos e até liberais, é aquela que liga uma putativa destruição da família a factores simbólicos tais como o feminismo, o marxismo cultural e a ideologia de género. Não se deve iludir o poder que os factores simbólicos possuem para questionar e desafiar as estruturas de qualquer instituição. A família não é uma excepção. Contudo, o que esses sectores nunca referem é que a economia moderna na sua versão dita neoliberal, de que eles são absolutamente reverentes, é um inimigo claro da família e, provavelmente, o factor mais poderoso na destruição da chamada família tradicional, como se pode verificar, mais uma vez, no Relatório sobre o Progresso da Igualdade entre Mulheres e Homens no Trabalho, no Emprego e na Formação Profissional. Não renovar contratos com mulheres grávidas ou com mães ou pais que exerçam os direitos de parentalidade que a lei lhes reconhece fará muito pior à saúde das famílias do que as supostas ameaças simbólicas que tanto aterrorizam esses sectores. Na verdade, essa direita é profundamente utópica. Vive colada na fantasia de uma família tradicional idealizada, a qual foi muitas vezes um espaço de terror desmedido. Sonha ao mesmo tempo com as mulheres em casa, enquanto acha que os salários devem ser baixos, mas que se deve consumir bastante para que o capital investido possa ser devidamente - isto é, avidamente - remunerado. Esta utopia que alimenta essa direita se chegada ao poder tem um enorme potencial para se transformar numa terrível distopia.

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