Lee Krasner - Abstract #2 (1946-48)
A eleição de Donald Trump bem como o chamado brexit chamam mais uma vez a atenção para um fenómeno recorrente na
vida política. Os actores, na ânsia de conquistar o poder ou de fazer valer
os seus pontos de vista, acabam enredados no próprio desejo que não os deixa
perceber como preconceito os preconceitos de que se alimentam e que confundem
com verdades universalmente aceites. Tanto no Reino Unido como nos Estados
Unidos havia muitos sintomas de um ressentimento popular crescente contra a
ordem estabelecida. Esses sinais, porém, chocavam com a visão do mundo tanto
dos defensores da manutenção do Reino Unido na União Europeia como dos democratas
e da intelectualidade que apoiou Hillary Clinton na corrida contra Donald
Trump.
É verdade que os sintomas tinham e têm uma aparência desagradável,
transbordavam de coisas que, segundo os valores que prezamos, são desprezíveis.
Cheiravam mal. Os sintomas, porém, não são a doença, mas sinalizadores da
doença. Ao recusar lidar com os sintomas, tanto os defensores da manutenção do
Reino Unido na União Europeia como Hillary Clinton e os democratas não
perceberam a dor profunda que atinge parte substancial do eleitorado.
Entregaram os doentes ao primeiro funâmbulo que apareceu. E os funâmbulos não
se fizeram rogados. Quem quer fazer política tem de se despir dos seus
preconceitos – isto é, do manto ideológico com o qual interpreta o mundo – e pôr-se
no lugar daqueles que vão decidir os resultados. Há muito, porém, que as elites
políticas ocidentais deixaram de saber pôr-se no lugar do outro. Ensurdeceram e
os resultados são os que vemos.
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