Juan Botas - School (1989)
A falta de paciência para coisas idiotas é um sintoma claro que se
entrou na velhice. Como cada vez mais a velhice é a minha condição, tenho cada
vez menos paciência. Por exemplo, nem que fosse santo – e um santo que se presa
tem uma paciência infinita – teria capacidade para perceber a lamechice patética
que se instaurou à volta da expressão escola
inclusiva. Eu não sou contra a escola
inclusiva, sou a favor. O que me põe fora do sério é o entendimento que
corre por aí – infelizmente, até entre gente com responsabilidades e com poder
de decisão – de que a escola inclusiva
não deve ser exigente com os alunos, deve estar preocupada com a auto-estima
destes, fomentá-la e, mais que tudo, não os deve avaliar com provas externas,
pois as crianças ficam infelizes – e lá se vai a auto-estima e o prazer – e isso
destroça os corações benevolentes dos papás.
O grande problema é que às crianças e jovens, quando chegam às
escolas, não lhes falta auto-estima. Têm auto-estima a mais. O que lhes falta
são regras e competência para regular o seu comportamento. Falta-lhes
capacidade para colocarem objectivos a médio e a longo prazo e persegui-los. Quando
a escola começa a exigir regras ou algum ministro se lembra de avaliar o que lá
se faz cai o Carmo e a Trindade. Pobres crianças que ficam infelizes, pois têm
de prestar contas e, para terem êxito, têm de adquirir regras em vez de se
deixarem andar segundo os seus desejos. A visão patética da escola inclusiva acha que tornar os
alunos mais responsáveis e exigir-lhes a
prestação de provas, que não sejam a santificada avaliação contínua, é lançá-los
na exclusão e torná-los infelizes, contrariar o princípio de prazer que deve
orientar a educação.
Não há paciência para isto, para esta retórica patética da escola inclusiva. A escola só será inclusiva se der a todos
aquilo que só alguns – graças à sua situação social – obtêm. O que pagam os
pais que colocam os filhos nos grandes colégios privados (não me refiro aos negócios que há por aí)? É verdade que pagam
relações sociais. Mas pagam muito mais do que isso. Pagam escolas exigentes,
que colocam dificuldades e exigem aos seus alunos que dêem o máximo. Não pagam
para esses colégios se preocuparem com a auto-estima dos meninos, nem os
educarem segundo o princípio de prazer. Pagam para que eles se tornem mais
capazes.
O desafio da escola pública inclusiva é fazer o milagre de dar a todos
os alunos aquilo que o dinheiro compra para alguns. Dar-lhes regras, fomentar a
exigência, pô-los perante provas e obstáculos para se superarem. Ensinar-lhes
que o princípio de realidade se deve sobrepor ao princípio de prazer. O papel da escola pública é apoiar, sem desfalecer, os seus alunos nessa aventura. Isto é
tornar a escola pública verdadeiramente inclusiva. O resto é fomentar a exclusão, a
discriminação e a reprodução das desigualdades através da retórica dos bons sentimentos, que ficam sempre bem a
quem os tem, mas que custarão, no futuro, muito caro às crianças que foram
vítimas de tamanha bondade afectiva. Não há paciência.
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