Hoje em dia, quimeras não são monstros mitológicos que combinam um
corpo de cabra, cauda de dragão e cabeça de leão. Hoje existem mesmo quimeras.
O Público explica assim o que são quimeras: "Normalmente um embrião desenvolve-se a partir de uma célula que é fruto da fusão de um óvulo com um espermatozóide, o que resulta num genoma único e num animal original. Desta vez os cientistas conseguiram juntar seis embriões de macacos rhesus diferentes, cada um apenas com quatro células. Os embriões misturaram-se, produzindo apenas um animal que tem células provenientes dos diferentes embriões, com ADN diferente. Ou seja, uma quimera."
Este jogo criativo a que se dedica a técnica derivada do conhecimento científico, que se manifestou, por exemplo, na clonagem ou, anteriormente, na fabricação de bombas atómicas, está longe de ser inócuo e obedece a um velho projecto de refazer, segundo
a intencionalidade humana, toda a realidade, incluindo a realidade humana. A
revolta de Prometeu contra a natureza tal como ela nos é dada é a essência
deste projecto que anima a modernidade desde o seu início. E esta revolta não
vai parar. Por isso, é completamente destituída de sentido a asserção do
cientista responsável pelo projecto ao sublinhar que ninguém quer “produzir
quimeras humanas”. O querer dos indivíduos é irrelevante. Desde que a técnica
esteja disponível, não haverá controlo total sobre ela e, talvez em nome da
saúde e do tratamento de alguma doença (justificação sempre útil), alguém
acabará por produzir quimeras humanas.
Se pretendemos pensar eticamente o que vem aí, é inútil centrar o pensamento apenas na limitação do uso das técnicas. O pensamento ético terá de confrontar-se com o projecto prometaico em curso, compreendendo-o como a essência do mundo em que vivemos. Não uma ética para evitar quimeras, mas uma ética para um mundo de quimeras humanas.
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