[A crónica semanal no Jornal Torrejano]
Teremos, enquanto comunidade nacional, chegado ao
fim? Terá o projecto iniciado por Afonso Henriques, em 1143, esgotado todas as
potencialidades? Não é apenas a malfadada crise, o desemprego crescente, o
empobrecimento inevitável. Nem sequer, o desânimo de ouvir, a cada passo, um
governante convidar os portugueses a emigrar, nem tão pouco o facto de termos
de suportar uma elite política ignara e indigente. Isso ainda seria suportável
e superável.
Incomoda o silêncio e a apatia dos cidadãos em
geral, que parecem aceitar tudo como se fosse um destino inexorável. Exultam os
governantes por não sermos como os gregos, por nos manifestarmos pacatamente,
como quem vai à procissão do Senhor Morto ou a um funeral. Cegos com a saloiice
do aluno bem comportado, como se vida de uma nação não passasse de uma temporada
escolar, as elites não percebem que a pacatez é sintoma de doença da vontade,
de falta de energia, de impotência de um povo que se entrega, em silêncio, ao
cruel destino de desistir de si mesmo.
Incomoda o carácter mesquinho das elites
económicas, sem qualquer interesse que não seja o da sua propriedade.
Iniciativa, risco, criação de riqueza, descoberta de novos mercados, de novos
produtos, alteração dos métodos de gestão, tudo isso parece, em Portugal, um
sonho. Esperam salários ainda mais baixos, mais horas de trabalho, mais uns
contratos com o Estado, se ainda for possível, ou, em alternativa a tudo isso,
pôr o dinheiro a render em algum paraíso fiscal.
Incomoda o silêncio da universidade e da
intelectualidade. Nada têm para dizer sobre o país, sobre as alternativas para
sairmos do pântano onde estamos atolados. Não há um debate sério, com conflito
de ideias, sobre a situação. Discutem-se aventais. Um país que está à beira do
colapso passa uma temporada infinita a discutir a magna questão de quem
pertence à Maçonaria.
Para onde orientar a economia? O que fazer da nossa
cultura? Como deveremos pensar a nossa relação com a União Europeia e para onde
deve esta caminhar? Como activar as nossas relações com as comunidades
portuguesas existentes pelo mundo? O que deveremos fazer na relação com o mundo
globalizado? Que problemas e que oportunidades resultam da nossa natureza
periférica e atlântica? Nada disto interessa à universidade e à intelectualidade
portuguesas.
Um povo impotente e doente da vontade, elites
impreparadas, mesquinhas e cínicas parecem anunciar o pior. É ensurdecedor o
silêncio que existe em torno do destino de Portugal.
Apesar do enorme desânimo que se abateu sobre a minha habitualmente positiva pessoa, nestas últimas semanas, e que tem origem precisamente no que diz e muito bem dito neste texto, não queria deixar de afirmar que talvez o silêncio seja ensurdecedor por existirem tantos rumores revoltados no seu seio. Há vários debates sobre a situação a realizarem-se pelo país fora, aqui em Lisboa também, a maior parte destes organizados pelos novos movimentos de contestação social como o Movimento 12 de Março, que já conseguiu uma auditoria à dívida, pelo menos. Organizaram-se um pouco por todo o lado assembleias populares, desde o 15 de Outubro, em que, pelo menos, se discutem ideias. Se alguma coisa de concreto e com poder de modificar o status quo daí virá, não sei...mas prefiro acreditar que sim, que este rectângulo com quase novecentos anos de existência se encontra apenas atordoado, e que se voltará a erguer das trevas. Digo prefiro acreditar por ser a única arma que possuo para não cair ainda mais no desânimo. Além disso, há algumas pessoas a escrever em blogues, jornais e nas redes sociais contra o adormecimento, entre as quais se encontra o prezado Jorge Carreira Maia. Já é alguma coisa, não...?
ResponderEliminar