quarta-feira, 22 de outubro de 2014

O negrume impenetrável

Georgia O'keeffe - Black abstration (1927)

O homem arrastou-se pelo negrume impenetrável.
(Sjón, A Raposa Azul)

A nossa cultura de homens modernos tende a ver os dias de hoje como mais luminosos que os do passado. Em muita gente persiste ainda a velha crença iluminista no progresso moral da humanidade, um progresso que vê, no desenrolar da história e apesar dos sobressaltos, uma contínua iluminação. Paralela a esta crença sempre existiu uma antagónica, alimentada nos subterrâneos da vida intelectual, onde se considera a nossa época como a mais negra de todas as eras, uma Idade de Ferro, para usar uma imagem derivada do platonismo, mas, por certo, bem anterior. Há nestas perspectivas evolucionistas e involucionistas da história um desejo de fugir - seja para o futuro, seja para o passado - da condição presente. E esta condição presente não é a de hoje, mas a de sempre. Cada época é, para os que nela vivem, um tempo de trevas pelo qual se arrastam. Por mais que se abram os olhos, somos impotentes para ver. Resta penetrar na escuridão. Uns imaginam luzes no fundo do túnel, outros aceitam a escuridão tal como lhe foi imposta. Seja qual for a nossa situação, o importante, porém, é aprender a arrastar-se nesse negrume impenetrável.

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