segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Os agentes da escuridão

Francis Bacon - Head (1951)

Aonde vais chega o outono e anoitece.
(Georg Trakl)

Retorno muitas vezes a estas palavras de Trakl quando penso em certas pessoas. Elas possuem um estranho poder, o de roubar a claridade onde ela existe, o de tornar sombrio o que é luminoso, o de transformar em trevas o que era apenas sombra. O outono de que fala Trakl não é o meu outono benfazejo. Este vem amenizar o tempo tórrido que quase me leva ao desespero. O de Trakl é já o sinal da acção do mal na vida comum. Perante essas pessoas, nunca sei se a produção de trevas é uma missão metafísica que, numa obscura dimensão da existência, lhe foi confiada, ou se se deve apenas a uma patologia grave da personalidade, que transforma um ser humano normal numa perversa encarnação do mal. Mas em todas elas – pelo menos nas que conheço – há uma distorção do carácter que é, ao mesmo tempo, sinal de uma pequenez congénita e uma espécie de luz negra, uma luz intensa mas que apenas derrama à sua volta escuridão.

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