Caspar David Friedrich - Autumn (1826)
Um sol baço corre entre nuvens, um rasto de luz quebra-se nos fios
de água. Aqui e ali, manchas azuis, um sobejo de Primavera, a nespereira
carregada de frutos, as rosas desfolhadas pela chuva. As casas são agora vultos
cansados, dobrados à garra afiada do tempo. Casas sonolentas, pardas de
esquecimento. Eu, pobre de mim, perco-me nas águas à tua espera, perco-me nas
tuas mãos onde, insensato, deixo um livro marcado por uma velha folha de
plátano. Perco-me no sonho de uma noite de Verão. Das janelas entreabertas
assomam vagarosas silhuetas, observam aquilo que passa, olham da sua eternidade
e abanam gravemente a cabeça. Assim julgam, naquela sabedoria que o cansaço
traz, o bulício que corre sob a inclemência do tempo. Depois recolhem-se no
vácuo negro onde habitam. No horizonte, há um vazio inominável e feroz. Alguém
grita. E eu oiço, aqui tão perto, um eco mudo vindo sabe-se lá de onde. A tarde
desvanece-se na vagarosa silhueta que em mim se recolhe à espera que tragas, na
tua, todo o Outono que nos espera. (averomundo,
2008/05/08, revisto)
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