Eduardo Gruber - ¿S/T? (1999)
As águas do canal, na sua limpidez, devolvem a imagem de casas e
arbustos erguidos na margem. Um mundo duplicado, cheio de cores, sombras e luz.
Dois barcos flutuam, presos a terra, à espera de alguém que os faça deslizar sobre
as águas. Na margem direita, uma primeira casa, talvez um depósito, exulta no
laranja e ocre e quase nos faz esquecer a ausência de janelas, como se ali
fosse um lugar de clausura, onde só alguém devidamente autorizado pudesse
entrar. Logo a seguir, um prédio de cores carcomidas pelo passar do tempo, de
três andares, com pequenas janelas fechadas. Mais à frente uma nova casa,
pintada de branco e com porta azul. Sobre esta, uma pequena janela circular,
quase um olho, denuncia um sótão. Entre ambas as habitações, crescem arbustos,
bem cuidados, onde a luz se matiza em diversas gamas de verde, um catálogo da
natureza que se oferece aos olhos do viajante. Na margem direita, um renque de
arbustos amarelos antecede novas habitações, uma casa semicoberta por árvores e
um prédio, de múltiplos andares, pintado de branco, com porta, varandas e
janelas azul de Prússia. Por detrás, germinam os campos recortados por figuras
geométricas perfeitas, campos com pastos a crescer para a fome dos rebanhos.
Hão-de vir das grandes casas perdidas do convívio da aldeia, casas de paredes
soturnas envolvidas por um halo de solidão, pelo cansaço que os campos sempre
deixam naqueles que os habitam. Ao longe, as montanhas olham benevolentes a
paisagem e estendem sobre ela o manto protector da sua sombra, enquanto no
canal, a água desliza na transparência levando consigo o reflexo das margens, o
retrato fluido da aldeia.
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