Thomas Cole - Expulsión. Luna y luz de fuego (1828)
Ali, um
espectáculo de fogos incandescentes, sublime, sublime, regurgitam os mirones, ruas
apinhadas, praças repletas e o povo, assim se chama à cercadura de pessoas, extasiado,
abre olhos e bocas, se tudo se ilumina e a noite perde, por breves instantes, a
negrura, a natureza a fizera. São as festas, vejo, o aguilhão mantém homens e
mulheres no ritmo que lhes deram e os calam e os afugentam e os fazem esquecer
a flor do cipreste, as águas insalubres, do céu agora correm. E assim viajam de
esquecimento em esquecimento, até que lhes doa o peito e as pernas, e uma cama
os acolha, tão derruídos, sem face que se mostre, sem palavra que se oiça, sem
dedo que aponte um caminho.
Os barcos
apodreceram e os barqueiros não sabem de remos nem velas. Escutam no fio da
noite o rumor dos passos, a água desliza para o mar, as mãos caídas, a língua
seca. Já não respiram, estão ali tão lentos à espera que a morte os leve, e
tudo passa diante deles, mas os olhos só vêem mares salgados, poentes
rancorosos, águas de xisto e areia, algas, cardumes maiores que o mundo. Presos
no horizonte, estão os olhos dos conquistadores, vítreos, lavrados em pedra,
desfeitos pelo vento. Barqueiros de barcos sem vela, navegadores do seco
oceano, gente esquecida, ébria, sem destino, gente perdida de festa em festa,
de olhos incandescentes, presos ao céu, ao artifício de fogo que se ergue e
logo cai, gente que sonha águas e ondas, um mar aberto para fugir da servidão
da terra, da corveia sem fim a pagar.
As mãos, mãos
ainda têm, pegam em artifício de madeira, para obrar em toda a obra, rasgar a
pele do animal, traçar rotas atlânticas, ou uma rua de casas caiadas e
laranjeiras bravas. Que tudo se afaste, pensam e vêem desfilar os elementos do
mundo. Ali vão eles alinhados, passo
certo, pés a estrondear no alcatrão da noite, essa que não vem. Se os fogos se
ateiam, os mirones dizem sublime, sublime, depois calam-se, baixam os olhos, e
caminham para casa. Pensam no mar, em caravelas, nas prostitutas dos grandes portos
à sua espera, pensam na noite, e o cheiro da luz a entrar-lhes pelas narinas, a
abrir o caminho para o cérebro, para a duna feroz do esquecimento. E ali vão,
desdentados e grisalhos, o lençol branco os espera, depois a terra fria e um
ramo de flores, se as houver, marca o princípio do aluimento. Apinham-se as
ruas e um espectáculo de fogos incandescentes amotina a madrugada, desenha
constelações no céu de veludo, as praças há muito abandonadas.
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