Shen Zhou - Branche de néflier
Assim, em última análise, o «post» da pós-Modernidade revela-se como o
«post» de uma idade pós-ocidental que ainda se busca a si própria. É um
«depois» que sacode as grades do presente e dá expressão a uma claustrofobia
dos tempos do fim. (Peter Sloterdijk, A
Mobilização Infinita, p. 218)
Quando Peter Sloterdijk escreveu estas palavras ainda o muro de Berlim
não tinha caído. Eram, porém, já claros os indícios de que o Ocidente deixara
de ser o centro da história. O período que vai de 1917 a 1989, devido à pressão
exercida pela ideologia marxista, em vigor numa parte substancial do planeta,
tem uma natureza equívoca. Equivocidade essa intensificada pelo facto de o
comunismo pretender ser uma saída da história e o socialismo real pretender ser
uma história que quer deixar de o ser. Ora esta relação conturbada do marxismo
com a história, essa perspectiva pré-moderna e pagã que foge à linearidade
mortal da história, foi, após a queda do muro e de imediato, abraçada pelo liberalismo
triunfante, que não via, nem vê, nada para além da sua própria vitória e a
submissão do mundo à utopia do mercado livre.
Aquilo que se passou de 89 para cá, apenas confirmou a intuição
irónica de Sloterdijk. Mesmo que os EUA ainda sejam, e por muitos anos, a
principal potência militar do mundo, a verdade é que vivemos claramente numa
«claustrofobia dos tempos do fim», vivemos, ao mesmo tempo, no aurora de um
mundo que não conhecemos, que não sabemos designar. Mas o ponteiro da história
volta-se decididamente para Oriente. O domínio dos EUA representa apenas o
tempo da agonia do Ocidente.
Mas o que será esse pós-Ocidente? Não pode ser outra coisa senão o
Oriente. Aqui há duas alternativas. Ou o Oriente que triunfa se funda nas
tradições de razoabilidade que, da China à Índia, passando pelo Japão, sempre
existiram, ou o Oriente é o Médio-Oriente e a tradição do Islão. A herança
ocidental, pois é já disto que se trata, apesar de ser constituída por uma
parte substancial recebida do Islão, parece ser melhor recebida e trabalhada no
Extremo-Oriente. Nestas últimas décadas, as culturas orientais têm dado provas
de uma grande capacidade plástica para, sem alterar os seus valores
fundamentais, absorverem a cultura ocidental.
Seja como for, a verdade é que entre a Europa e esse mítico Oriente há
uma barreira, o mundo inquieto do Islão. O que é perturbante não é a
possibilidade de a nossa civilização não sobreviver. Sobreviverá nesse Oriente
extremo. O que é perturbante é imaginar que a Europa possa não sobreviver,
apesar da sua cultura se ter propagado e entranhado, em parte, no Oriente. A
demografia, o cansaço, a velhice não auguram nada de bom perante vizinhos tão
jovens e irrequietos. (averomundo,
2008/01/21)
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