Joerg Immendorff - Café Deutschland IV (1978)
Vasco Pulido Valente recordava, no artigo da passada sexta-feira, no Público, que "desde o fim do século XIX existiram duas correntes no imperialismo alemão: uma, donde veio o nazismo, que favorecia a construção de um império clássico fundado na força; outra que preferia um império económico, que a Alemanha regeria através de Estados clientes, embora aqui e ali com uma ocasional intervenção armada". O que estamos a assistir, onde se inclui a trapalhada inominável do confisco em Chipre, parece dar completa razão a Pulido Valente. Vale a pena olhar para a história, para a história relativamente recente e tentar perceber algumas linhas de força.
A criação da CEE - posteriormente, União Europeia - visava um certo equilíbrio entre as potências europeias, nomeadamente a Alemanha e a França. Os demónios do nazismo estavam demasiado vivos e o orgulho alemão bastante quebrado pela derrota. Foi possível, nesse quadro, lançar um projecto económico e político de solidariedade e desenvolvimento comum. Por norma nunca se refere - portanto algo que é recalcado - que esse projecto nasceu e foi possível não apenas porque a Alemanha fora derrotada mas porque estava dividida. Havia duas Alemanhas, o que tornava a República Federal comedida e relativamente inofensiva nas suas pretensões.
Podemos pensar que o actual processo de destruição das solidariedades europeias se liga à nova situação criada com a queda do muro de Berlim e a unificação alemã. Mesmo que os primeiros anos da unificação tivessem sido muitíssimo caros para os alemães, a verdade é que o equilíbrio entre economias e potências europeias se foi desfazendo a favor da Alemanha, por mérito desta, mas também por cobardia de outros. É uma Alemanha unificada e com uma economia saudável que vai aproveitar a oportunidade aberta pelas crises do subprime nos EUA e, logo a seguir, das dívidas soberanas dos países do sul da Europa.
Nesta crise, a Alemanha tem se comportado não como um parceiro entre parceiros, mas como um rival que vê os adversários no chão e, em boa lógica de guerra, os subjuga, através das políticas do Banco Central Europeu e de outras instituições europeias, até não mais poderem respirar. De facto, a economia tem servido muito bem o desígnio de certas forças alemãs que nunca deixaram de sonhar com uma política imperial. E quando tudo parece, para nós europeus do sul, desabar, os dirigentes alemães passeiam-se impávidos e serenos aceitando tributos e bajulações. Os alemães primeiro compraram-nos com os seus gadgets e dinheiro para os comprar e agora são impiedosos com os escravos. As coisas são o que são, e a política nunca deixará de ser um jogo de domínio e de submissão.
Acima de tudo: Pisando tudo e subjugando todos.
ResponderEliminarQue pena um muro só ter dois lados para cair, quem sabe se existisse um terceiro lado as consequências não seriam tão terríveis.
Abraço
Há qualquer coisa que lhes está na massa do sangue. Duas derrotas em conflitos mundiais não foram suficientes para os acalmar.
EliminarAbraço
Infelizmente, a verdade nua e crua. Não tenhamos ilusões, pois é isso mesmo, até a afirmação de «lhes estar na massa do sangue»...além do mais, «esqueceram-se» que os países que massacraram lhes perdoaram cinquenta por cento da dívida e que lhes permitiram o acordo de ir pagando o resto em suaves prestações consoante o crescimento...Custa-me dizer isto, pois tenho amigos alemães (alguns com vergonha de serem alemães!)...Camus tem um livro chamdo Cartas a um Amigo Alemão...terei de o reler...do uber alles ao «arbeit macht frei» vai um passo...germânico.
ResponderEliminarSim, por certo haverá muitas alemães que acharão tudo isto inaceitável, mas também haverá muito ressentimento que agora se sente triunfante.
EliminarBoas releituras.