segunda-feira, 11 de março de 2013

O caso húngaro - a perda da evidência

Francisco Bayeu y Subías - La Tiranía de Gerión (1757)

O que significam, de facto, as alterações constitucionais (aqui e aqui) que o actual poder político húngaro está a introduzir no sistema político do país? Pouco importa o juízo que cada um de nós possa fazer sobre elas, mas antes indagar o seu valor enquanto sintoma político de um tempo. Regimes políticos baseados no voto dos cidadãos mas sem uma verdadeira democracia existem um pouco por todo o lado. São uma espécie de tributo que as tendências ditatoriais, por enquanto, sentem obrigação de pagar ao prestígio da democracia. Que tendências destas ocupem o poder em países da própria União Europeia tem um significado radicalmente diferente do que se tal acontecer, por exemplo, na Rússia ou no mundo árabe. O caso húngaro pode ser pura e simplesmente conjuntural, mas nada nos diz, neste momento, que ele não represente uma tendência emergente na Europa. Percebe-se, por isso, a preocupação dos líderes europeus e norte-americanos. Há uma coisa, porém, que as opções políticas de Viktor Órban tornam claro: as regras demoliberais que fundamentam os Estados da União Europeia e a cultura política ocidental começam a deixar de ser evidentes, de tal maneira que um membro da própria União Europeia se atreve a desafiá-las. E talvez isto seja aquilo que é importante no caso húngaro, o sinal de que as regras que tínhamos santificado como as únicas verdadeiramente boas podem perder a sua evidência e a força legitimadora do poder político.

6 comentários:

  1. Não sei se a Hungria é um 'case study', mas lá que é esquisita, disso não pode haver muitas dúvidas, basta rever a História.
    Os útimos a apresentarem-se como candidatos a futuros "ditadores" (a actual maioria) começaram por se afirmar libertários e democratas-centristas e afinal já estão a virar...

    Abraço

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    1. Veremos o que aquilo vai dar, mas os tempos andam mesmo muito fora dos eixos.

      Abraço

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  2. Meu Caro,
    Deliciosamente (safa!) perversa essa dos "eixos"...
    Só faltava mesmo era que os hungaros e outros cúmplices de então, repetissem a (des)graça.

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    1. Haverá, por certo, quem sonhe com eixos. Os tempos estão propícios para os sonhos mais perigosos...

      Abraço

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  3. Sò não consigo desenhar o mapa que nos trouxe num salto temporal da obsessão pelo politicamente correcto até este escancarar das intenções.
    Muitos dos que clamavam por ordem já gritam por liberdade.

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    1. Por vezes, o tempo histórico acelera e não percebemos como se passa de uma fase para outra num piscar de olhos. Talvez não haja mesmo mapa nenhum a desenhar nem ciência desses acontecimentos. Acontecem e são sinais e talvez nada mais do que isso. Se há coisa ingrata de teorizar é a história. É uma dama muito caprichosa.

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