quinta-feira, 7 de março de 2013

Poema 53 - São tempos de multidões alucinadas

John Ruskin - A River in the Highlands (1847)

53. São tempos de multidões alucinadas

São tempos de multidões alucinadas,
a melancolia das horas desavindas,
um resto de alegria na distância.
Suporto o peso do mundo sobre os ombros
e vejo os barcos deslizar no rio.
Vão lentos e impassíveis no fulgor da água,
música sanguínea na guelra do silêncio,
o tempo quebrado pelo uivo do caçador.

Perdi-me no espelho da natureza
e nada sei de declínios e renascimentos,
dos escombros de uma sombra,
o segredo de um vulto ao anoitecer.
Sou filho de um deus imponderável,
de uma razão que ninguém escuta.
Vivo de pequenos animais cansados,
presos na traição de uma armadilha.

Eis o tempo transfigurado pela cólera,
a hora de uma harmonia discorde,
enleada no tronco da velha árvore,
que o tempo esqueceu de apagar.
Tudo tem um destino provisório.
As avenidas que ferem a cidade,
o perfume da pele que me arrebatava,
a rosa abandonada do teu coração.

2 comentários:

  1. Muito belo.
    A liturgia de um tempo que sangra e necessita(va) de ficar prenhe de novos tempos.

    Um abraço

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