A decisão dos professores pela greve nesta altura é
uma decisão difícil, mas representa um grito de desespero de um grupo
profissional que, desde 2005, tem sido sistematicamente perseguido e
aviltado. Os professores, mas também a escola pública e os seus alunos,
foram transformados em inimigo, ao qual os governantes (sejam quais
forem) patenteiam um ódio especial e uma vontade, nunca saciada, de
perseguição. O que está em jogo, neste caso, diz respeito aos
professores (horário de trabalho e mobilidade), mas também, e muito, aos
interesses dos alunos e da comunidade em geral.
Desde 2005, a degradação – e não estou a falar dos salários – das
condições de exercício da profissão nunca parou. O aumento da actividade
burocrática, o aumento do número de alunos por turma, a diminuição de
horas atribuídas a certas disciplinas e o aumento dos horários lectivos
estão a destruir as condições para que o trabalho de um professor dê
frutos. As condições mínimas de uma escola de qualidade razoável já
foram destruídas, mas este governo pretende ir muito mais longe.
O trabalho feito, nos últimos 35 anos, pelos professores
portugueses e pela escola pública, tem sido notável. Os níveis de
escolarização subiram drasticamente e o desempenho dos alunos
portugueses nos estudos comparativos internacionais tem mostrado que o
esforço realizado tem tido resultados, tirando Portugal dos últimos
lugares. Outro dado importante é o número de alunos que as escolas
públicas colocam no ensino superior e que este forma. Têm sido tantos
que a economia, com um desempenho muito inferior ao sector da educação,
não os consegue absorver. Importante também é o que foi revelado por um
estudo da Universidade do Porto: os alunos da escola pública mostram-se
mais preparados para o ensino superior que os colegas vindos dos
colégios particulares. Deste modo, a escola pública e os professores que
nela trabalham têm contribuído decisivamente para a igualdade de
oportunidades e para uma sociedade mais justa e equilibrada. Por isso,
pelo seu êxito, são odiados e perseguidos.
Tanta perseguição cansa. Os professores estão exaustos de tanta
instabilidade, de tanta mudança sem sentido, de ser maltratados pelos
governos. Durante estes dias de greve, muitos professores que participam
nela, por esse país fora, estarão na escola a trabalhar gratuitamente
com os seus alunos para os exames. Sempre foi assim e, certamente, será
assim no futuro. Os professores fazem greve por si, claro, mas também
pelos seus alunos e por uma escola pública que continue a servir a
comunidade. E é a destruição da escola pública que a actual governação
visa.
Estudo no 12º ano, tenho 18 anos. Sou uma entre os 75 mil que têm o seu futuro a ser discutido na praça pública.
ResponderEliminarDizem que sou refém! Dizem que me estão a prejudicar a vida! Todos falam do meu futuro, preocupam-se com ele, dizem que interessa, que mo estão a prejudicar…
Ando há 12 anos na escola, na escola pública.
Durante estes 12 anos aprendi. Aprendi a ler e a escrever, aprendi as banalidades e necessidades que alguém que não conheci considerou que me seriam úteis no futuro. Já naquela altura se preocupavam com o meu futuro. Essas directivas eram-me passadas por pessoas, pessoas que escolheram como profissão o ensino, que gostavam do que faziam.
As pessoas que me ensinaram isso foram também aquelas que me ensinaram a importância do que está para além desses domínios e me alertaram para a outra dimensão que uma escola “a sério” deve ter: a dimensão cívica.
Eu não fui ensinada por mágicos ou feiticeiros, fui ensinada por professores! Esses professores ensinaram-me a mim e a milhares de outros alunos a sermos também nós pessoas, seres pensantes e activos, não apenas bonecos recitadores!
Talvez resida ai a minha incapacidade para perceber aqueles que se dizem tão preocupados com o meu futuro. Talvez resida no facto de não perceber como é que alguém pode pôr em causa a legitimidade da resistência de outrem à destruição do futuro e presente de um país inteiro!
Onde mora a preocupação com o futuro dos meus filhos? Dos meus netos? Quem a tem?
Onde morava essa preocupação quando cortaram os horários lectivos para metade e mantiveram os programas?
Onde morava essa preocupação quando criaram os mega-agrupamentos?
Onde morava essa preocupação quando cortaram a acção social ou o passe escolar?
Onde mora essa preocupação quando parte dos alunos que vão a exame não podem sequer pensar em usá-lo para prosseguir estudos pois não têm posses para isso?
Não somos reféns nessa altura?
E a preocupação com o futuro dos meus professores? Onde morava essa preocupação quando milhares de professores foram conduzidos ao desemprego e o número de alunos por turma foi aumentado?
Todas as atrocidades que têm sido cometidas contra nós, alunos, e contra a qualidade do ensino que nos é leccionado não pode ser esquecida nunca mas especialmente em momentos como este!
Os professores não fazem greve apenas por eles, fazem greve também por nós, alunos, e por uma escola pública que hoje pouco mais conserva do que o nome. Fazem greve pela garantia de um futuro!
De facto, Crato tem razão quando diz que somos reféns, engana-se é na escolha do sequestrador!
E em relação aos reféns: não são só os alunos; são os alunos, os professores, os encarregados de educação, os pais, os avós, os desempregados, os precários, os emigrantes forçados... Os reféns são todos aqueles que, em Portugal, hipotecam presentes e futuros para satisfazer a "porra" de uma entidade que parece não saber que nós não somos números mas sim pessoas!
Se há momentos para ser solidária, este é um deles! Estou convosco*
Inês Gonçalves
https://www.facebook.com/ines.goncalves.146612
Obviamente, este texto é excelente, por todas as razões. Vou postá-lo já no FB e no Faceprof. Obrigada, JCM.
ResponderEliminarNão tem que agradecer. Estamos todos cansados de ser perseguidos e humilhados.
EliminarSempre procurei manter uma postura não calculista nem ambígua, mas prudente e aconselhável, para quem, como eu, não capta a verdadeira amplitude da trapalhada, em que as decisões políticas, desta governança de módica competência, nos envolveu a todos, professores, pais, alunos e cidadãos atónitos.
ResponderEliminarMas não tenho dúvidas acerca da justeza da luta dos professores e, por consequência, também eu me sinto "professor" solidário e participante.
Um Abraço fraterno
A trapalhada conjuga duas vertentes. Em primeiro lugar, Nuno Crato, como Lurdes Rodrigues, não sabe absolutamente nada de educação. Dizia umas generalidades de aparente bom-senso no Expresso e na televisão, com as quais se concorda facilmente, mas a especificidade da vida numa escola era-lhe e é-lhe desconhecida. Em segundo lugar, há uma agenda ideológica (já existia, embora diferente, com Sócrates) na governação, uma agenda que visa transformar os professores em gente muito, mas muito mal paga. Isto não tem a ver apenas com o défice. Pretende baixar o custo do professor para privatizar as escolas. Privatizar significa que o Estado, como já acontece, dá dinheiro a empresas de educação e estas gerem as escolas. Os lucros dessas empresas virão dos magros salários pagos aos professores. Há muita gente desejosa de pôr as mãos nos dinheiros públicos da educação. É isto que está em causa. Há muito que, no ME, há inimigos da escola pública que vão minando e tornando a sua existência num inferno. Enfim, isto não vai parar enquanto parte substancial dos salários dos professores não for parar às contas dos futuros "empresários" da educação.
EliminarAbraço e obrigado pela solidariedade.
Mas eu não digo que são tão, mas tão incompetentes...?
ResponderEliminar"Que o recurso deve ser aperfeiçoado"? "Que o assunto não é urgente e têm 10 dias para se esmerarem"?
Não é de ir às lágrimas?
Juro que há muito que não via prova mais provada de incompetência encartada.
Começo a convencer-me que se toda a gente percebesse a incompetência destas criaturas e rebolasse a rir à frente deles em vez de lhes obedecer, isto se resolvia num instante.
Sim, há muita incompetência, mas também um problema ideológico e interesses muito grandes que suportam esta gente. Uma das teses possíveis - não da minha autoria - é que este tipo de gente incompetente não acontece por acaso. São aqueles que podem, sem problemas de consciência, executar certo tipo de agendas políticas imorais.
EliminarUm bom fim-de-semana.