Reuters - Público
O cruzamento de duas notícias sobre o mundo da ciência e dos direitos de propriedade mostram o terreno nebuloso que, devido aos avanços da investigação científica, pisamos, sem um guia moral e jurídico seguro. Há dias, o Supremo Tribunal dos EUA, perante um conflito em torno da patente sobre os genes humanos BRCA1 e BRCA2, veio reconhecer, por unanimidade, que a separação destes genes do material genético que está à sua volta não é um acto de invenção. Sendo assim, os genes não podem ser patenteados. No entanto, os juízes consideraram que há uma diferença entre o ADN natural e o ADN sintético, criado em laboratório. Este pode ser alvo de patentes.
Passemos para um extraordinário acontecimento científico ocorrido na Universidade de Aveiro. Uma equipa de investigadores conseguiu alterar o código genético de um ser vivo. O Público afirma mesmo que se quebrou uma das regras sagradas da biologia. "Até agora, acreditava-se que o código genético era imutável, ou seja, uma vez fixado, nos primórdios da evolução das espécies, já não poderia ser alterado sem consequências funestas para o organismo afectado". Tanto quanto um leigo pode perceber, e eu percebo pouco, o que se passou foi a criação de um novo ser - neste caso de um fungo - com um outro código genético. Um ser sintético, digamos assim.
Quebrada a tal regra sagrada da biologia, abre-se um novo caminho de criação de seres sintéticos, com os seus criadores, segundo o Supremo dos EUA, a poderem patentear estas suas invenções. Por longe que esteja a passagem, deste tipo de operações, dos fungos para seres mais complexos, o caminho está aberto, como está aberto o caminho para patentear o mecanismo central da vida de espécies sintéticas.
Duas notas finais. Em primeiro lugar, não sei se a diferenciação jurídica entre ADN natural e ADN sintético é moralmente aceitável. Julgo, na minha ignorância, que ela contém em si potenciais problemas. Em segundo lugar e tendo em conta a dificuldade sentida em decifrar tudo isto, parece-me que a educação sobre questões científicas, nomeadamente ao nível da Biologia, precisa de um grande incremento. Não me refiro, claro, a uma educação que transforme todos em biólogos, mas que forneça os rudimentos para compreender estes fenómenos e ajude os cidadãos a tomar parte na discussão pública que este tipo de coisas, mais tarde ou mais cedo, vai levantar.
Será porventura um comentário pouco científico mas, confesso que estremeço só de pensar que já tivemos a "eugenia nazi" e que, quando a ciência "cai" em mãos erradas, as consequências podem ser terríveis.
ResponderEliminarAbraço
O principal problema é que os cidadãos têm cada vez menor capacidade para tomar decisões , ou discuti-las, sobre assuntos que a ciência coloca mas que têm implicações sociais e políticas muito importantes.
EliminarAbraço
É caso para dizer que vamos começar a ver "a vida às rodas".
ResponderEliminarTalvez, se não for coisa pior.
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