Pérez Villalta - El discurso de la verdad (1978)
A Ivone, quase no fim do post Personae, escreveu: Se para ver um filme ou ler um livro, deve seguir-se aquele conceito que Samuel Coleridge muito bem enunciou como a suspension of disbelief,que é uma aceitação da convenção do fictício, isto não é verdade mas vou crer que é, um blogue deve ser lido muito ao invés disso, numa adequada suspension of belief. Há nisto qualquer coisa de perverso, vamos lá ver se consigo entender-me.
O leitor de blogues deve suspender a crença. A analogia com a suspensão da descrença de Coleridge remete-nos para a seguinte ideia: o leitor deve tomar como ficção aquilo que lê num blogue, mas, acrescento eu para tornar a analogia completa, aquilo que lê não é fictício. Não é tanto a dificuldade que o leitor possa sentir em suspender a crença que me importa, embora, devido à nossa inultrapassável tendência para a crendice, seja mais fácil suspender uma descrença do que uma crença.
A questão, porém, é outra. Que relação tem o autor de certas palavras com o que nelas está dito?Espera-se, se não estamos no reino da ficção, uma certa autenticidade de quem escreve, mas isto deve-se à nossa necessidade de crer e não a qualquer elo que ligue as palavras a quem as escreveu. O problema não é apenas o da máscara social, o da personae com que me revisto e me apresento no espaço público. O que todo o leitor deveria saber e talvez não saiba é que as palavras não expressam quem as escreve, mas são-lhe estranhas. Ao serem escritas, estranharam-se ao seu autor, e surgem perante ele como um libelo acusatório.
Escrever é diferente de falar. A fala desvanece-se no acto que a produz, a escrita, porém, permanece. E nesta permanência ela torna-se absolutamente ameaçadora para quem a escreveu. Quando escrevo eu não fabrico uma máscara social. Quando escrevo entrego as provas contra mim e colaboro com os meu inimigos, mesmo que os não tenha, para que me destruam a máscara social e, como eu também sou essa máscara, me destruam. Alguém escreve a outra pessoa uma carta de amor. Aquilo é a expressão de uma autenticidade? Nunca se saberá, o próprio autor nunca terá a certeza absoluta da autenticidade do seu impulso. Mas é uma prova perante a qual o seu autor terá de responder. Escrever é sempre produzir matéria para a nossa acusação.
Exatamente. Escrever é muito mais arriscado que falar. É toda uma exposição. Engraçado como aparecem aquelas frases que dizem: Mulheres que leem são mais perigosas.Que dizer então das que escrevem? Oh, meu deus,como arriscam muito mais.
ResponderEliminarEscrever é sempre um risco, embora se deva desconfiar do elo que parece existir entre o que escreve e aquilo que é escrito.
EliminarIsso mesmo, querido Jorge: "o leitor deve tomar como ficção aquilo que lê num blogue, mas, acrescento eu para tornar a analogia completa, aquilo que lê não é fictício.", e isto é aquilo que um bom leitor compreende sem que lho expliquemos.
ResponderEliminarQuem escreve,mormente quando o faz num registo diarístico, oferece sempre o ouro ao bandido e entrega-o de papel passado,que é como quem diz escrevendo. E sempre responderá por isso e sempre as palavras serão usadas contra quem as escreve.
Estou em querer que, malgré tout, valerá a pena.
Mais uma vez te agradeço seres tão bom leitor das minhas escritas.
Seja como for, somos sempre culpados. Nada a fazer. Talvez ajustar contas com a Eva e o palerma do Adão, mas talvez seja demasiado tarde.
Eliminar«Com as palavras todo o cuidado é pouco, mudam de opinião como as pessoas.»
ResponderEliminarJosé Saramago in: As intermitências da morte
Abraço
Nem mais. Delas, há que esperar tudo.
EliminarAbraço