domingo, 3 de maio de 2015

Apologia do jogo

Paul Klee - Spirit Drinking and Gambling (1927)

Tudo se reduz então a este grande problema, para aquele que quer empregar os seus semelhantes em proveito próprio: Encontrar homens que o orgulho os incita a servir-me e cujo interessa não os afasta de mim. Por consequência, tudo se reduz a conhecer um grande número de homens. Jogai então muito, para que vos vejam. Qualquer outro meio é fraco em comparação com o jogo. Para se ser da casa, nada há melhor, e a maioria das ligações vêm dele. Aliás, que coisas úteis nascem desta feliz instituição! [Joseph de Maistre, Six Paradoxes à Madame la Marquise de Nav...]

Eis uma belíssima apologia do senso comum e da sagacidade nas relações práticas. O que pode espantar à nossa moralidade é o método proposto, o jogo. Com Maistre estamos naquele limiar em que a aristocracia e a burguesia se cruzavam na rua do poder, uns para sair e outros para entrar. Ele, um aristocrata recente, apesar da sua posição contra-revolucionária, não deixava de ter sido já educado no espírito de cálculo introduzido pelo pensamento moderno. Nesta apologia do jogo, cruzam-se a sagacidade do nobre Ulisses e o cálculo daqueles que querem pôr os outros ao seu serviço. Eis um reaccionário moderno. O que Maistre não podia saber é que o jogo passaria de instrumento da vida social a essência da própria sociedade. Na verdade, a vida das sociedades actuais, com a importância que as bolsas e os mercados financeiros mundiais possuem, tornou-se um jogo, mas um jogo em que aqueles que jogam não sabem nem querem saber daqueles que são jogados. [averomundo, 2009/10/08]

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.