sexta-feira, 2 de março de 2012

Pensar e dirigir


A minha crónica semanal no Jornal Torrejano.

Existem muitas causas que ajudam a explicar a situação na qual vivemos. Excesso de consumo, esbanjamento de recursos, investimentos desadequados, corrupção política, eleitoralismo, problemas de formação, baixa produtividade, etc. Se quisermos compreender não apenas a superfície da situação mas aquilo que permitiu o acumular dos erros, teremos de encontrar outro tipo de explicações. Que atitudes estão na base de tudo isto?

Em primeiro lugar, a ausência de espírito crítico. A sociedade portuguesa é avessa à discussão crítica, ao confronto de ideias, ao conflito de pontos de vista. Na vida das instituições (públicas e privadas) o exercício crítico, o debate de ideias, o conflito sobre os caminhos a tomar praticamente não existem. As instituições portuguesas são verdadeiros túmulos. O silêncio é de ouro e quem ambiciona subir, ou apenas deseja não ser enxotado porta fora, não levanta ondas. Não levantar ondas é o ideal regulador da acção do português.

Isto implica que empresas privadas e instituições públicas definhem. Os erros acumulam-se, constituem-se em hábitos, formam verdadeiras tradições. O silêncio que as chefias, por uma questão de autodefesa, cultivam e a que as pessoas, também por autodefesa, se submetem significa uma demissão de pensar e uma ausência efectiva de compromisso com a instituição. Num mundo em que a economia se fundamenta no conhecimento, em Portugal cultiva-se o silêncio das igrejas e a paz dos cemitérios.

Em segundo lugar, e em conexão com a ausência de pensamento crítico, temos lideranças frágeis. Se as pessoas não são levadas a pensar criticamente, como forma de melhorar o desempenho da instituição ou da empresa a que pertencem, isso está intimamente ligado à qualidade das lideranças. Genericamente, Portugal não tem líderes, mas chefes que têm medo da discussão, do debate e do confronto de ideias. As chefias em Portugal vivem no terror de que a sua incapacidade se torne óbvia e, por isso, não só evitam suscitar qualquer tipo de pensamento crítico dentro do seu feudo, como o reprimem, caso ele surja. Não percebem que o papel de uma liderança é tirar partido, para a organização, do conflito de ideias, dos pontos de vista descentrados e desviantes.

A péssima preparação técnica das lideranças destrói a imaginação, exclui o pensamento crítico e afoga empresas e instituições na pura rotina até que se tornem obsoletas e um peso morto para a sociedade, a qual lentamente se foi tornando ela própria um enorme peso morto.

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