Esta belíssima foto do fotógrafo espanhol Samuel Aranda ganhou a edição deste ano do World Press Photo. Claro que a fotografia pode simbolizar a dor e o afecto que suportaram a denominada Primavera árabe. Ali está a coragem e o exercício do cuidado, desse cuidado que Heidegger tematizou sob o termo alemão de Sorge, que não é outra coisa que o amor. Nada de diferente da Pietà cristã, onde Maria segura nos braços o Filho morto. E no entanto, há uma diferença absoluta. Eu não vejo o rosto nem da mulher nem do homem, fica apenas o gesto sem sujeitos que o suportem. Se queremos perceber o que nos distingue do mundo árabe-muçulmano, basta olharmos para esta tão estranha Pietà. Não há sujeitos do amor, apenas o próprio amor simbolizado no gesto. Na Pietà de Miguel Ângelo tudo conflui para o rosto de Maria, nesta não há um rosto que me devolva a experiência terrível da mulher, uma expressão do cuidado, do temor ou do horror da violência.
Belíssima fotografia. Diria que mais forte ainda que a Pietá de Miguel Ângelo. Por não ter rosto a mulher que ampara. E por não ser o Cristo em sofrimento, o Filho Unigénito, mas um ser humano, demasiado humano, pungentemente humano. Esse amor, essa Sorge é compaixão. Uma categoria de amor raríssima hoje em dia. Belíssimo é também o texto que a acompanha.
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